Quem passa pela Rua Adolfo Konder em Chapecó percebe algumas movimentações entre as árvores e a discreta entrada do Centro de Atenção Psicossocial de Álcool e Drogas. A casa atrás de outro prédio não esconde nada do que a sociedade não queira ver. O portão sempre aberto é mais do que a entrada em uma casa, é o início de um caminho longo. Um caminho que inicia com a consciência própria, de algum familiar ou da própria sociedade de que chegou a hora de mudar o rumo. Uma estrada de recuperação que tem em cada pedaço da estrutura física, profissional e psicológica do CAPSad um significado.
O CAPSad atende cerca de 600 pessoas por mês. Rosa Maria Chiaradia, coordenadora do CAPSad Chapecó, explica que atendem mais pacientes com vícios relacionados ao álcool e crack, as outras drogas tem uma demanda menor. Rosa comenta que há uma diferença em relação a população de mais alta renda, geralmente eles chegam com vício em cocaína, maconha e êxtase. Já as pessoas com menos condições financeiras chegam com o vicio do crack e ocasionalmente o oxi.
“A visão da sociedade em relação ao CAPS é que aqui é um depósito de lixo e na verdade não é, são seres humanos que precisam de ajuda, sendo ajudados estão tentando voltar à sociedade.” Alberto Santos.
Alberto Santos resolveu que havia chegado a hora de buscar ajuda há cerca de sessenta dias. Desde os doze anos o vício de álcool e drogas ilícitas, como chá de cogumelo e o que ele chama de “auáca”, lhe tapou a visão e direcionou em um caminho onde muitas coisas foram ficando para trás. Aliviado, percebe que uma delas, a cada dia, tem ficado mais longe dos olhos: o vício que lhe tirou quase tudo. Lágrimas constantes nos olhos. Para que cada palavra que saía parece que uma fita precisa ser rebobinada em processo lento e doloroso. A dor de recordar as escolhas evidencia-se em um olhar que ao fundo transparece esperança, mas visivelmente expressa cansaço. Cansaço da bagagem longa carregada durante anos de entrega a um vício que hoje é encarado como uma doença. “Eu fui obrigado a vir para o CAPS, não obrigado por ninguém, eu me obriguei a vir, tomei a liberdade de procurar ajuda”, relata.
A liberdade é o que falta a um dependente químico, liberdade de ir e vir, de amar e cuidar, de ser cuidado e escolher abandonar o vício. “Eu abandonei casa, família, perdi tudo, ai eu vi que estava em uma situação irreversível, e foi aí que eu pedi ajuda para os meus filhos”. Nem para admitir a doença há liberdade, Alberto relata que o dependente acha que tem o controle sobre o vício, mas não tem, “sozinho é quase impossível sair”, comenta.
As marcas de anos de vicio estão visíveis nas mãos de Mariovaldo. Além das marcas do tempo ele resolveu tomar uma atitude que não o deixasse esquecer o que o vício fez com ele. Em cada dedo um anel, cada anel, representa um vício que ele teve. Dentre elas, a cocaína, o crack e o álcool. Com todos os dedos preenchidos, ele observa com orgulho e clareza do que cada anel significa para o seu tratamento, “os anéis estão aqui para eu olhar para eles e me lembrar, o anel não pode voltar atrás e nem eu”, comenta. Aos sete anos Mariovaldo aprendeu com o exemplo do pai que a bebida era o caminho a seguir, o álcool alargou as portas para a entrada de outros tipos de droga na vida dele.
Ouça parte da entrevista com o dependente químico, Alberto Santos.